domingo, 21 de outubro de 2007

O livro da estante

O bom e velho livro na estante estava esquecido há tempos, ele percebeu a poeira tocando na capa, uma poeira sombria que ele afastava com um sopro de ar que levava as partículas para os outros livros no chão, estava de mudança, chegara na nova casa à noite e estranhara os objetos deixados pelo antigo morador, quadros, livros, uma poltrona, uma velha chaleira, estranhamente tudo que precisava naquela noite depois de arrumar os seus pertences e dar lugar aos seus livros na nova velha estante, estava cansado e não terminara de organizar tudo, nem tinha trazido tudo, mas a poltrona ainda nova estava lá quase que a sua espera. Respirou fundo e percebeu o silêncio do novo endereço um silêncio que jamais havia escutado, um silêncio que restava naquele lugar cheio de passado, onde só conseguia escutar seus pensamentos, teria sido melhor mesmo mudar de lugar, fugir da incompreensão da cidade? Neste instante percebera que ficaria louco se continuasse ali, mas foi só por um momento, só porque estava só, e a solidão assusta.
O café quase que derramava na chaleira, vago nos seus pensamentos acordou e correu para desligar o fogo, sentado na poltrona perto da janela sentia o vento bater nos pêlos da sua face e logo percebeu que já estava se acostumando com o lugar, pegou no livro que havia sido deixado na casa e folheou as páginas, nunca havia lido aquele chamado Noites brancas, era a estória de um homem que se apaixona por uma mulher que apenas lhe deu um único beijo e que partira, mas mesmo assim ele se sente feliz, por ter um único momento de felicidade. Apropriado, pensava.
Tinha fugido, fugido não de uma cidade feia e suja, nem de um trabalho maçante, até gostava, tinha fugido de um amor não-correspondido, ela o havia deixado, ela descobrira que não o amava mais, e ele a amava profundamente, sofreu, mas deixou que ela seguisse o seu caminho, o que poderia fazer, de todos os males do mundo a falta de amor parece o pior, e pior para esquecer também pois em todos os lugares que você vai esse estranho sentimento assim chamado de amor está presente, basta ligar a tv ou o rádio, uma revista, um livro, e lá está ele, assim como estava no livro que encontrara. Tinha entrado em depressão e achou melhor se “isolar” por um tempo num lugar distante sem muitas pessoas, para refletir dizia. A noite era escura demais e a falta de luzes artificiais dava lugar ao brilho das estrelas, poderia se contar muitas, percebeu, vagou pela varanda e mais uma vez se notou só, será que essa solidão seria o melhor jeito de esquecê-la? Pensou. Mais uma vez estava pensando nela, nos poucos carinhos que ainda conseguiu ter antes que ela fosse embora, mais uma vez pensava, e pensava que seria ainda muitas noites e muitos dias pensando. Não conseguia desviar dos pensamentos, um certo amigo lhe disse para não fugir e aceitar tudo que acontecesse, era a melhor forma, mas a melhor forma que achou foi fugir, desde criança sempre fugira de todos os seus medos, desde o menino valentão do ginásio até o chefe do trabalho, desde os sermões do pai até o sofrimento da perda de sua mãe. Mas naquele instante percebeu que não adiantava, o amor que sentia era inacabado, ou tentava tê-la mais uma vez ou aceitava conviver com ela mas sem ela. Tinha funcionado, tinha fugido para aquela casa para refletir e em menos de uma noite estando lá já havia refletido tudo, precisava voltar, seria difícil, mas dessa vez era uma questão de honra não fugir, voltar...voltar...voltar.... O café respingou na sua blusa e antes que fosse procurar outra para vestir, fechou a mala e decidiu voltar no mesmo instante, pegou os livros da instante e colocou tudo de volta na caixa retornando tudo ao carro, antes de ir olhou a casa que lhe afeiçoara no pouco instante em que estivera, olhou para tudo e viu o livro que havia sido encontrado quando chegou na casa, foi à estante e o pegou, era o que precisava, talvez fosse a próxima companhia nas noites que viriam solitárias, talvez aprendesse com o personagem a se conformar, a aceitar que o seu amor era inacabado, a aceitar que o dela diferente do dele tinha acabado, a aceitar que não conseguia esquecê-la mas que um dia tudo ia passar e o que ia ficar era lembrança de um momento de felicidade, assim como o personagem do livro.

sábado, 13 de outubro de 2007

Pretensão

Te quero simples
nu, explicito
barba, ombros, cabelo.
Te quero homem
romântico
tímido e extrovertido
piegas e verdadeiro.
Te quero usar
te guardar
menino, homem, animal.
Te quero livre
sem exageros
vaidoso e pretensioso
poético e preguiçoso.
Te quero macho
sexo
cigarros, costas, falo.
Te quero meu
vícios, segredos, decepções.
Te quero sempre.
Com tua face em meu peito
teu coração a transbordar.
Te quero
quando quiser.