terça-feira, 26 de janeiro de 2010

Mais infinito do que eu pensava

Ela me pegou nos braços e me levantou aos céus, as nuvens passeavam sobre a terra num continuo movimento que a fazia girar. A vida passava, e eu era criança de novo a cada mimo recolhido nos seus braços moles e macios. Nem parecia ter a idade que tinha, sua pele era tão lisa quanto a minha, mas se deslizava pela carne mole que os anos trouxera. Seus olhos se apertavam sorridentes e havia neles um afeto estranho que me povoava de uma angústia que eu não sabia explicar. Tantas vezes me irritava, com todos os seus conselhos super protetores, tantas vezes quis gritar diante dos seus ouvidos, mas era impedida pela força oculta de sua hierarquia. Era rainha submersa em panos de prato e eu nem percebia, enquanto meu nariz era mais alto e eu subia a rua apenas o enxergando, de costas para o seu afeto que me preparava doces e almoços dignos dos deuses. As nuvens continuavam a passear e meus pensamentos perdidos em busca de respostas me trancafiavam num quarto escuro habitado somente por mim. Era eu que precisava entender. A angústia vinha mais uma vez e dessa vez guardei sua vinda e procurei entender porque o mundo girava e eu continuava parada. Tantos anos vividos dentro dos meus vinte anos, tantos círculos feitos pela terra, e era justamente no ápice de um giro que eu percebia que a amava e que por isso sentia angústia. Sentia angústia por não compreende-la, por estar ao seu lado como uma estátua viva, por não conseguir uma comunicação que me fizesse provar tão bem quanto ela ao me fazer um simples omelete o quanto a amava. Eu a amava e só sentia isso quando demonstrava o contrário. Estava ligada a ela por laços mais que sanguíneos, eram laços entrelaçados pelas nuvens que vi quando ela me levantou com seus braços, pelos anos passados ao seu lado em silêncio, sem compreender porque se sentir tão estranhas sendo tão familiares. Seus olhos eram meus e ela sorria com eles como eu. Era parte minha antes da minha existência. E a mera partícula que sou brotava de vida no momento em que vi seus olhos afundados numa lágrima confusa que dizia “estou viva”. Chorei e mergulhei profundo naquela lágrima, vi então os céus escorrendo, os anos, os dias, as horas, preciosas brilhando como diamantes achados num açude turvo de mistério e desconhecimento. Emudecia com todo silêncio contido na sua imagem, eu a procurava e quando a encontrava me sentia feliz ao perceber sua beleza, seus cabelos também pareciam com os meus e me faziam entender que nela encontraria também o que sou. Me encontrei e me achei tão morta quanto as previsões dos seus futuros dias. Eu era carne jovem, viva e inútil. Me senti culpada, castigada por mim mesma. E ela estava ali com os mesmos braços abertos, era pura compaixão, amor e simplicidade. Lhe abracei com calma, querendo tirar um pouco de cada sentimento seu que eu admirava, senti seu cheiro e entendi. Ela era mais forte e agora eu não me sentia mais culpada. Dentro do que eu não conseguia expressar pela estranheza da nossa convivência eu percebi o que já sabia, e tentei me povoar naquele instante de toda aquela certeza. Foi então que a encontrei com toda a força que me levantou nos braços anos atrás, com a vida se esticando em suas rugas, era a vida lutando, existindo, e eu era só um começo. Abri então os olhos e vi o céu mais infinito do que eu pensava.

Um comentário:

Perto de Mim disse...

O infinito é bom. Beijos.