quinta-feira, 30 de julho de 2009

Silêncio para escutar.

Os minutos também andam, com pressa e não respondem a ninguém. Olho o relógio com aflição, minha juventude passa, atenta molho o corpo com a intenção de tirar o corpo velho do passado e me sentir mais jovem, me sentir outra, visto a roupa com a intenção de parecer algo, de novo algo desejado, olho no espelho e só vejo a minha aparência, os anos, e o que os outros dizem que sou, uma figura construída por escultores egoístas, olho e não vejo nada que tenha sido da minha preferência, nem mesmo o corte de cabelo que eu escolhi, nem mesmo a roupa que comprei, algo inusitadamente induzido por forças que não se sabem bem de onde vêm, se da tv, se da moda, do cinema, da internet, dos amigos, da família, olho e me vejo, e na aflição da ansiedade de poder ver o que realmente procuro, acho-me perdida dentro do que não sou, mas nem por isso me desespero, cumprimento a figura no espelho e saio com a certeza de que encontrarei pelo caminho milhares de espelhos refletindo de novo um corpo e uma roupa induzidamente escolhidos. Se as minhas mãos pudessem passar o que senti ao tocar os seus cabelos, não precisaria falar e não precisaria ter respostas, a propaganda da tv diz que as perguntas movem o mundo, e sinto assim que a respostas o param, procuramos respostas em tudo, até num simples olhar enviesado, temos as palavras para nos comunicar, mas nem sempre as palavras saem de nossas bocas da maneira que desejamos, as vezes elas nem saem, em outras vezes é preciso estar calado e escutar. Como posso responder com o silêncio? Se eu pudesse teria mais tempo de responder depois com palavras, palavras certas, mas elas nunca são, e o silêncio seria a solução para dizer exatamente tudo aquilo que sentimos, sem erros, sem lapsos, sem o “eu não queria ter dito isso”. O silêncio de um olhar, o silêncio de um toque, pensando bem o silêncio também confunde, pensando nos silêncios dos olhares, estes se não forem bem examinados não são bem interpretados. Mas talvez eu procure a resposta de um silêncio de verdade, sem pensamentos, estes pensamentos que nos tiram do lugar de onde estamos presentes, quero estar presente em silêncio, e escutar o que passa agora, porque é tão difícil escutar a realidade? Estar presente não é estar com o corpo colocado em tão local, se eu estou aqui estou pensando em várias coisas, meu corpo está sentado nesta cadeira, com as mãos sobre o teclado digitando tais palavras, mas a minha mente esta em vários lugares, que os meus olhos não podem acompanhar, e é por isso que as vezes se perdem, troco as palavras e me distraio. Só me sinto presente quando realmente quero, e é algo que não é tão fácil de controlar, se eu conseguisse veria e sentiria as coisas mais plenamente, é um exercício que equivale a meditação, como diz um filósofo indiano que li esses dias, “morrer para renascer”, morro para o passado para viver plenamente o presente, eis algo difícil de conseguir. Tentei morrer com o passado, abri o chuveiro e tomei um banho num ritual que pudesse me lavar do que eu não queria mais ser ou ter, me enxuguei e os restos deste passado ainda estavam no meu corpo, os restos sujos do passado continuam em nossas mentes, e nós os prosperamos nos acontecimentos da vida, não estando realmente presente no presente. Mais eis que um segundo do toque das minhas mãos em seus cabelos, e o leve encontro dos nossos olhares a buscar respostas em um e outro, fez do presente, presente, ali eu estava completamente, com os milhões de eus que me habitam, os escolhidos e os induzidos, estavam todos no mesmo lugar repetindo o mesmo gesto numa seqüência sincronizada, marcados no tempo naquele local escolhido, me senti presente e ao meu lado uma promessa fugidia de amor. Eis a resposta, encontrada no silêncio, a resposta da busca, a resposta da vontade de estar presente, é só com o amor que nos sentimos presentes, é só com o amor que nos sentimos eternos. E por amor procuramos respostas.

Fumo

Bem que as mãos também falam
Atentas elas tocam
O que os lábios querem tanto tocar
Aflitas tremem
E o cigarro é aceso com dificuldade
Com a chama vejo meu drama
Sentir para mim é acender este cigarro
Sinto e queimo.
Logo as cinzas caem
E onde elas caem não posso prever
Um cigarro infinito
Não paro de fumar
Tão rápido às vezes como um palito de fósforo apagando
Mas sempre me dar prazer
Amargo o gosto que fica na boca
Como fumo
Nicotina amarelando o meu sorriso
Ou fumaça saindo das narinas ocultando a visão
Trago lentamente para sentir acalmar a sensação
E me acabo junto a este cigarro.

sexta-feira, 17 de julho de 2009

Girassóis


Tanto canto
pelo canto dos teus olhos
que estes olhos achei,
assim por acaso na rua coberta de gente.
Com tanta gente
a perseguir horários
me esbarrei na película fina entre o desejo e a razão
pulei nos teus olhos
e vi girassóis,
girando dentro da minha cabeça.
Com as mãos atentas
e as pernas bambas
quase que fugi,
mas fiquei ali
parada
correndo entre os girassóis.

quarta-feira, 15 de julho de 2009

Danço


É verdade que quero dançar
Já faz tempo que procuro o ritmo certo pra minha dança
Não importa o parceiro
Se suas mãos combinarem os passos com as minhas
Danço
E não importa o salão
Se houver luzes
E elas clarearem o que é importante
Danço
Com vestido ou não
Quero sentir a presença de existir
e a melodia também não importa
danço
até as pernas quererem parar
e as portas dos bares fecharem
e os instrumentos desafinarem
se o meu ritmo estiver em sincronia
eu danço
até ensurdecer este silêncio mudo
que me impede de dançar.

terça-feira, 14 de julho de 2009

Sem saudade

Tua imagem se esvai
como um papel solto ao vento
lenta.
Procuro teu apertar de olhos
fechando os meus
e só acho as tuas pálpebras
embaçadas
como num sonho,
teus olhos fechados a sonhar
e os meus abertos a acordar
procurando o sonho perdido
entre a cama e a noite.
Não consigo mais te achar
te perdi
como um sonho bom acordado
e um pesadelo superado,
deixando os dias sem olheiras
e as noites insones.
Quantos rostos lembrei depois que te esqueci?
Quantos sorrisos me deram
mais chances de nunca mais te lembrar?
Te perdi
e já fazia tempo.

segunda-feira, 13 de julho de 2009

Pálida visão


Se a noite me trouxesse uma visão
Tão clara quanto a luz da lua
Sob o copo de cerveja nítido de amarelo,
Um deslocar de girassol
Girando para mim
Como um rosto amarelo de nitidez.
Nítido seria esse destino
E haveria paz nas casas, nas ruas e nos prédios.
Haveria uma escolha
E não haveria hipóteses.
Uma visão
Certa como a certeza que o sol tem de tomar o lugar da lua
Certa como a normalidade
A rotina das madrugadas,
Sem a angústia de decidir
Entre o vácuo e o vazio
Uma visão
Como quando dois pares de olhos acesos se encontram
Amarelados por algum desejo distraído
Amarelados de álcool e cevada
Amarelos
De uma palidez insossa
Que reflete em cada copo uma cor
Tomada com gosto por quem também procura
A mesma visão.

quinta-feira, 9 de julho de 2009

Solilóquio

Fluir...
Deixar o vento
(e)levar-se
Dentro de mim.
Cometer erros.
Enfim somos humanos,
Mas a humanidade precisa acertar.
Acerto o olho em direção às palavras
Se movem em seus significados
Movem-se ao lermos
Não há nada mais infinito que sentir
E o mundo lá fora
É só o mundo lá fora
Que mal há em estar só?
Tomo um livro
Tomo um café
Tomo conta da minha solidão
Há de sermos sozinhos
Para sermos melhores
Porque procurar distrações?
Não existe felicidade no tempo
Este tempo se consumindo com o:
não-ter-o-que-fazer-e-o-que-amar
Somos todos inúteis
Há tantas coisas mais simples de amar
Mas escolhemos as mais difíceis...
Escolhemos um ser qualquer no espaço
Sem querer
Só para o tempo não ser contado
Só para não existir o tédio
E o tédio existe sempre
É o tempo
Longe do relógio
Longe de mim e você.
Viver
Junto ao tédio
Existir é uma busca
Do que nunca se encontra.

Caro coração



Parece que neste coração cabem muitas reticências...
Solilóquios mudos
E grandes pontos de interrogação imersos sobre exclamações interrompidas.
“Inútil você resistir ou mesmo suicidar-se” diz o poeta na tela do computador,
E eu pensei em não falar sobre “eus”
Talvez refletir sobre algo mais importante
Talvez não falar de amor
Amor este que vai e volta
Basta abrir a porta
E dizer palavras doces.
Meu coração quer se entregar
Samba-canções adora ouvir
É burro feito mocinha de romance
E se você caso queira dar uma chance
É capaz de fazê-lo se apaixonar.
Talvez se outro coração quisesse se entender com o meu
Não seria mais trágico ouvir melodias
E nem seria triste o dia de São Valentim,
Talvez se o coração que meu coração tanto quer
Pudesse ouvi-lo
Diria que essas batidas não são em vão.
Será que ele diria?
Será que o meu ainda quer?
Será que lá fora o frio esquenta?
Apenas imagino...
E enquanto isso
Este coração continua só.



“Meu coração é um sapo rajado, viscoso e cansado, à espera do beijo prometido capaz de transformá-lo em príncipe” (Caio F. Abreu).

terça-feira, 7 de julho de 2009

Uns olhos...

Seus olhos querem dizer algo
Duas perguntas que não consigo responder
Ha se eu descobrisse o que estes olhos dizem...
Faria pirâmides com os segredos desse teu olhar
Enviesados e desavisados
Não sabem que os meus só conseguem te ver
Talvez até desconfiem
Mas nunca dizem
E a tua risada infantil me deixa mais boba
És esfinge
E eu
Quero apenas te devorar.