sábado, 14 de novembro de 2009

Aqueles olhos claros

Chiquinho foi embora depois do carnaval, já farto de tanto batuque e pauladas.
A vida não era fácil, brigas cotidianas, grana curta. Um dia todo mundo cansa.
Ninguém sabe ao certo por onde ele anda agora. Uns o viram acabrunhado próximo à feira, outros juram que ele conheceu outro alguém e apaixonado decidiu sumir. Amelie estava muito focada em suas novas atividades. Depois de tanto tempo juntos ela se interessou por vida acadêmica e boêmia e em nenhuma delas cabia mais Chiquinho. Às vezes ele passava dias inteiros sem ela e quando se viam não era a mesma coisa. Não por ela, não sejamos injustos. É que Chiquinho lá dentro dele almejava outros braços, braços mais atenciosos. E dava pra notar em seu olhar perdido por baixo da mesa de sinuca. Um belo dia tomou coragem, atravessou ruas e ruas e tomou gosto pelo vento que rodava solto por seu corpo. Cheirou porcarias e carne fresca, parou diante dos carros e acelerou quando podia. A casa ficava cada vez mais distante e não sentia saudades. O chão chamava mais chão e ao olhar para trás nada o impedia de prosseguir. Cansado durante a noite desejou uma só vez a velha cama de tapete e a água fresquinha perto da porta da cozinha. No mais, seu coração aventureiro rimava versos ao som de novos batuques de outros carnavais nada parecidos com os de antes. Mas aquela casa com tijolos quadriculados e o leve roçar das mãos de Amelie sobre os seus pêlos lhe fez entender que as aventuras de uma nova vida não lhe era assim tão atraente, nada se comparava ao cheiro do colo de sua amada, nem mesmo o contato com o chão gelado de sua antiga casa, e as músicas que vinham do rádio da sala direto para seus ouvidos quando estava dormindo. Lembrou do último olhar que viu de Amelie, incompreensível como o último olhar que deu a ela, azul e enrugado, Amelie entendeu mas não soube dizer como, seus olhos reproduziram a mesma sensação, era a derradeira vez que o vira. E assim não sentiu a mesma calma que sentia quando lhe encontrava no terraço, dormindo no tapete, calmo, mesclado, de olhos tristonhos que pediam carinho, e ela dava mesmo sem os ver, tantas vezes lhe sufocou com isso, tanto que Chiquinho despejava sobre ela seu veneno felino, e lembrando disso Chiquinho sofreu, lamentou a fuga, lamentou o último olhar de Amelie, lamentou os novos amores encontrados, lamentou a volta. E descendo a calçada em busca dos dedos delicados de sua verdadeira amada que chorava sob a varanda da casa quadriculada a sua espera, encontrou o brilho de uma luz que não sabia de onde vinha, esse brilho ofuscou sua visão e deixou tudo claro. Amelie continuava a esperar.

Por Paula e Lella

3 comentários:

bocadepoema disse...

paaata-que pareo.Nossa ficou mt bom.como é leve o traço do amor,não? Via e lia a história de outro âmbito, vc chegou e a moldou bem melhor que eu.O bom é que ficou a duas mãos porém se sente que são duas mãos.Olha aí, a gente funciona juntas.

bocadepoema disse...

p.s: usaria de zeugma para alguns termo antes mencionados nas ultimas linhas.

Saulo de Tasso disse...

Amei.