sábado, 6 de dezembro de 2008

"As palavras deviam exprimir exatamente aquilo que queremos dizer"



Mesmo que a recordação do cheiro passe eu ainda devo levá-lo para algum lugar por um tempo, para o abismo do meu coração, no passado trancado a portas que não abrem mais, ou para as caixinhas coloridas cheias de lembranças onde posso abrir a qualquer hora. Eu aprendi que de tudo sei sobre o nada, e que se volto atrás sou a pessoa mais estúpida do mundo. Estupidez é o que eu digo, ingenuidade é o que falam. E se falam mentem, e se escrevem poemas desabafam, nunca use um poema para mentir, não dá certo. Seria também a traição mais cruel ao sentimento que não sente. Poema é coisa séria, escrever é coisa séria, isso eu aprendi, aprendi tentando escrever, só não aprendi a escrever. Acredito no que a Clarice Lispector disse sobre escrever, que escreve para encontrar as respostas, um auto-conhecimento, é bem claro isso quando escrevemos, tentamos exprimir algo além da palavra, algo que não poderíamos dizer, e na maioria das vezes erramos, as palavras traem, assim como na fala também se erra na escrita, não dizemos aquilo que queremos e quanto mais nos conhecemos mais nos perdemos nesse conhecer. Me escondo e me acho quando escrevo, me mostro e me escondo. Eis porque escrever se torna um vicio, queremos achar mil coisas dentro de nós, mil pedacinhos falhos e acertados, mil coisas doces e ásperas, encontrar a beleza que não existe na nossa superfície. E queremos nos mostrar, porque somos os bichos mais vaidosos, mas às vezes mostramos tanta coisa feia e nos escondemos como bichinhos medrosos. O mais medroso é o escritor, ele guarda tudo que sente para seus textos, decora tudo para falar e não fala, guarda tudo para depois vomitar no papel, bichinho egoísta também e vaidoso, até o mais tímido adora mostrar o que escreveu. Eu gostaria de levar agora o cheiro que senti para esse texto, faz tempo que tento, mas não consigo, por quê? Eu queria guardá-lo, tirá-lo de mim, já esfreguei mil vezes, queria tomar banho de ácido, porque sabonetes e água não bastam. Mas o cheiro se impregnou, tomou conta e continuo a senti-lo mesmo que tapando o nariz, algo fora do corpo, psicológico, que se mistura ao físico para dar vida ao que só existe na imaginação. E que fique na imaginação já que o real é o que existe, não quero ilusões para curar o tédio, não quero poemas, nem declarações, quero verdades, beijos e abraços e outras coisas que se possam tocar. Mas agora acho que já falei demais como sempre, tantas palavras para perceber que não queria dizer nada disso.

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